sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Rir é o melhor remédio?


Certamente, a adaptação para o teatro de uma obra literária daquele que, por não poucos, é considerado o maior nome da literatura destas terras tropicais, não é tarefa fácil. O escritor é ninguém mais ninguém menos que Machado de Assis e a obra de que se trata é o seu conto de 1882, “O Alienista”.
O cinema nacional oferece exemplos tenebrosos de releituras precipitadas, assim como no teatro, não raro, tropeçam as produções em olhares totalmente despropositados da obra machadiana.
“O Alienista: Uma Leitura Esquizofrênica” mostra, justamente, o oposto; a adaptação do conto clássico do Bruxo do Cosme Velho para a encenação de um monólogo é impecável.
“Com a pena da galhofa e a tinta da melancolia”, a peça é pintada, sendo ressaltados os aspectos exatos pelos quais a obra do escritor faz-se perene. A ironia fina é prato cheio para o ator Gustavo Ottoni, de cuja língua escorre veneno e a quem se deve (em especial) o mérito de fazer da arte em cena, espetáculo. Transmutando-se freneticamente numa gama de personagens, assume, ora na imagem do excêntrico Dr. Simão Bacamarte, ora no retrato das figuras mais bizarras que habitam a vila de Itaguaí, o grotesco peculiar dos tipos humanos microscopicamente analisados no conto de Machado, enquanto denuncia uma sociedade hipócrita, guiada pelas aparências e jogos de interesses (não muito diferente da que conhecemos atualmente).
A discussão continua no debate filosófico acerca dos limites tênues entre razão e insanidade, sendo posta em questão o influente papel da ciência, que, no século XIX, exercia a sua inquisição do pensamento.
Apostando no humor inteligente e sagacidade, o monólogo prende o espectador durante todo o tempo. O cenário intimista, composto por apenas uma única cadeira, além da iluminação preciosa, que toma conta do palco com sua coloração verde, fazem com que o público vivencie o universo absurdo da Casa de Orates do Dr. Bacamarte.
Para quem sofre da doença do tédio e da mesmice contagiosa de comédias que abusam do apelo sexual e palavreado chulo gratuito, eis o remédio. “O Alienista: Uma Leitura Esquizofrênica” capta o espírito do texto de Machado na dose certa. Altamente recomendável.

Direção: Gustavo Ottoni e Letícia Guimarães

Local: Teatro da UFF, Rua Miguel de Frias, 9, Icaraí, Niterói

Dias: 21, 22 e 23 de agosto

Horários: Sexta e sábado, às 21h Domingo, às 20h

Ingressos: R$ 30, R$ 20 (com filipeta), R$ 15 (estudantes, servidores da UFF e maiores de 60 anos)

Classificação etária: 12 anos

terça-feira, 11 de agosto de 2009

Subversa recomenda...


Na última sexta feira, a Subversa marcou a sua notável presença no clássico palco niteroiense do Centro de Artes da UFF, na noite de estreia de mais um espetáculo teatral cômico, estrelado pela veterana atriz global Elizabeth Savala. Neste monólogo intitulado de Friziléia, a atriz se personifica em uma mulher comum, síntese da Amélia à brasileira, que exausta de ver seus sonhos reprimidos em defesa de valores sociais e familiares, ou por falta de coragem/iniciativa de combatê-los, encontra-se à beira de um ataque de nervos e uma consequente crise de identidade.
Durante os ligeiros 90 minutos, a hilária operária do lar consegue a façanha de divertir e atrair emocionalmente os espectadores presentes, principalmente as espectadoras e, fazê-las protagonistas da história ficcional, fielmente imitada pela realidade, além de permitir a reflexão sobre a árdua tarefa de ser uma mulher pós-moderna, mesmo convivendo num meio de costumes e instituições passadistas, que nos remetem para o período medieval.
Enfim, a tragicomédia “Friziléia” apresenta como mote a revisão pessoal que a personagem faz, utilizando-se das tonalidades cômicas, dos sonhos da juventude e das escolhas que a levaram ao aparente beco sem saída em que se encontra – um casamento sem vitalidade, mantido por inércia e nenhuma realização pessoal. O espetáculo resulta em entretenimento de qualidade, sem ambições, mas também sem apelo à vulgaridade.
É interessante esclarecer que a Subversa não se restringe a recomendar aos nossos saudosos e assíduos leitores espetáculos artísticos inseridos nesta categoria literária, porém a oferta de produções artísticas desta natureza apresenta-se em número exorbitante, tanto em nossa querida Niterói, quanto nos palcos cariocas.

sexta-feira, 7 de agosto de 2009

Subversa Recomenda

"O Leitor" (The Reader)



Atendendo a recomendações intimativas para assistir ao filme “O Leitor” (The Reader), do diretor inglês Stephen Daldry, senti-me tentado (obrigado) a descobrir o que a obra guardava de tão especial, além das 5 indicações da Academia (melhor atriz, melhor roteiro adaptado, melhor fotografia, melhor filme e melhor diretor).
Fazia tempo mesmo que já haviam comentado sobre o filme comigo (que, vale lembrar, é baseado no livro homônimo do escritor alemão Bernhard Schilnk) e vez e outra ouvia o seu nome em conversas casuais; enfim, desde que foi lançado nos cinemas brasileiros, no início deste ano, interessei-me por ele por trazer como protagonista a vencedora do Oscar ’09, Kate Winslet (aquela mesma de “Titanic” e “O Amor Não Tira Férias”), que, previsivelmente bela, surpreendeu com uma excelente atuação.
A história começa no ano de 1995, quando Michael Berg, um homem melancólico, interpretado por Ralph Fiennes, relembra um passado distante que, no entanto, é elemento determinante para entender o seu presente. Um flashback repentino leva o enredo para o final da década de 50, na Alemanha Ocidental, quando o jovem Michael, de apenas 15 anos e acometido de escarlatina, é socorrido pela já madura e misteriosa Hanna Schmitz, interpretada por Kate Winslet, envolvendo-se com esta num romance arrebatador. O menino vive seu primeiro amor e tem sua vida transformada completamente.
O título do filme faz referência a uma característica especial do relacionamento dos dois. Nos encontros amorosos, Hanna interessa-se pelas atividades de Michael na escola, em destaque a literatura. A partir de então, pede sempre para que o jovem leia algumas das obras clássicas que estuda, revelando um incomum interesse pelas leituras.
Uma grande reviravolta e alguns saltos no tempo mudam totalmente o quadro da história. A cada minuto mais envolvente, o drama de Daldry expressa de forma veemente até que ponto podem ser questionadas nossas maiores verdades. Para o universo das Letras, acrescenta-se, ainda, o quão longe podem nos levar as palavras e seu poder de humanização. Assim como é apontado no filme, o mistério é característica fundamental na literatura ocidental, sendo confirmada a tese pelos personagens de “O Leitor”, que trazem consigo um grande segredo, elemento imprescindível para o desvelar de sua trama.

Título: "O Leitor" (The Reader)
País de origem: EUA/Alemanha
Gênero: Drama
Classificação etária: 16 anos
Duração: 124 minutos
Ano de lançamento: 2008

Conto Infantil


Quem apagou a luz?


Maria era uma menina muito esperta. Quando perguntavam quantos anos ela tinha, respondia rapidamente:- Tenho assim (e mostrava dois com os dedos da mãozinha), mas vou fazer assim (e os dedos agora eram três).
Maria gostava muito de bichinhos. Na sua casa ela tinha um cachorro chamado Pet. Ela tinha também três peixes. Um se chamava Papai Bill. O Outro era Mamãe Paola. E o último também se chamava Maria. Que nem ela.
Maria gostava sempre que as luzes estivessem acesas. Ela não gostava de escuro. Até mesmo quando estava no carro, sentada em sua cadeirinha, e entrava em um túnel, logo perguntava:
- Quem apagou a luz?
Maria não tinha medo do escuro. Ela apenas gostava de claridade. Aliás, medo mesmo ela só sentiu uma vez. Era um dia que estava chovendo muito.
E ventava também. Maria não ligava para a chuva. Ela gostava do cheiro que a chuva trazia.
Mas quando ficou de noite a chuva não parou. Nem o vento. E para piorar a luz acabou. Maria correu para perto da mamãe Paola e logo perguntou:
- Quem apagou a luz?
A mamãe falou que a chuva estava muito forte e molhava tudo, por isso apagou a luz. Mas avisou que não era para Maria ficar com medo. Ela iria acender uma vela e tudo ficaria claro outra vez. Era muito importante, porém, que Maria não mexesse na vela, pois o fogo poderia queimar a sua mão.
As velas, entretanto, não adiantaram: A luz era pouca e a chama tremia por causa do vento, fazendo com que as sombras ficassem assustadoras.
Maria correu para perto do seu avô Pedro e voltou a perguntar:
- Quem apagou a luz?
O seu avô coçou o seu bigode e respondeu:- O vento balança o fio. O fio se solta do poste. E o poste não trás luz para a nossa casa.
Maria não ficou satisfeita. Não entendeu porque alguém apagou a luz e o seu medo não tinha passado. Ela estava chorando quando um passarinho verde pousou em sua janela e disse:
- Porque uma menina tão bonita está chorando?
Maria respondeu:
- Porque acabou a luz. E eu estou com medo. E nem minha mãe, nem o meu avô sabem dizer quem apagou a luz.
- Eu sei quem apagou a luz! - disse o passarinho.
- Sabe? Sabe mesmo? E você pode me dizer quem apagou a luz? - perguntava Maria ansiosa.
- Claro. Veja bem: Você já percebeu que, de vez em quando, a luz acaba de noite? - o passarinho perguntou.
- Já. Já sim. - respondeu Maria, prestando muita atenção ao que lhe dizia o passarinho e enxugando as suas lágrimas.
- Você já reparou também que a sua casa fica entre uma rua e uma mata bem verdinha?
- É. Fica mesmo!
- Então, nesta mata vivem muitos animais. Macacos, Capivaras, Passarinhos, Tatus, Gambás e até mesmo Onças. Em algumas noites eles não conseguem dormir. Sabe por que?
- Não. Por que? - perguntou Maria. E quem respondeu esta pergunta foi o Macaco que apareceu de surpresa na janela, dando um susto em Maria.
- As luzes de todos esses prédios iluminam a mata.
- Tem muito poste. E também o farol dos carros nunca param de passar na rua. - completou o Tatu, que enfiava a cara na janela da menina.
- Nossa... - suspirou Maria, reparando bem a cara de sono do Macaco.
- Mas o pior mesmo é aquele letreiro ali. Piscando sem parar. Todos os dias. Bem aqui em cima das nossas cabeças. - A onça era a mais brava.
- Então quando não aguentamos mais ficar sem dormir, todos nós nos reunimos em cima daquela pedra bem alta e desligamos a luz de toda a cidade. - falou o passarinho.
- Um dia, pelo menos, a gente precisa dormir. - continuou a Onça, sendo aplaudida por um monte de animais. Menos a preguiça que não tinha mais força para nada.
- Até mesmo o seu cachorro não consegue dormir todos os dias. Olha como ele está dormindo bem agora, no escurinho. - falou o Macaco.
Maria olhou para o Pet deitado, pensou em como as pessoas que moravam tão perto dos animais não cuidavam deles. E percebeu que enquanto conversava com os animais o seu medo já tinha passado.
- O mais importante, Maria, é que agora você já sabe porque falta luz de noite. Sabe que somos nós que apagamos a luz para poder dormir. E não precisa mais ficar com medo. - quem explicava era a Coruja.
- Isso mesmo, minha amiguinha. Agora se você me dá licença, nós precisamos ir. Temos muito o que dormir. - disse a Onça.
Nesse momento a mamãe chamava Maria.
- Filha. Você está sozinha no quarto? Não está com medo do escuro?
Quando Maria olhou para a janela os animais já tinham ido. Ela pensou em todos aqueles bichinhos deitados e dormindo confortavelmente e responde:
- Não mãe. Medo do escuro nunca mais.
A mamãe não entendeu muito bem, mas gostou de saber que Maria não tinha mais medo de escuro. Deu um abraço bem forte e um sorriso bem grande.

Claudio Junior